História do Rock no Cinema | Filmes Sobre os anos 70
Texto: Rober Machado
Colaboração: site Omelete
Quase Famosos
Cameron Crowe foi o mais jovem repórter da revista Rolling Stone, contratado em 1972 quando tinha apenas 15 anos.
Escreveu sobre diversas bandas da época e acompanhou turnês. Depois de sair da revista, Crowe seguiu a carreira cinematográfica.
Com o sucesso de Jerry Maguire, ganhou carta branca para realizar um projeto que sonhava há anos: um filme autobiográfico sobre seu período na publicação. Sua opção foi pela criação de uma ficção fortemente inspirada na sua vida ao invés de um relato biográfico.
Quase Famosos (Almost Famous), lançado em 2000, narra a história do jovem William Miller que se torna repórter da Rolling Stone aos 15 anos, no início dos anos 70, e acompanha a turnê da banda Stillwater, um grupo fictício baseado em diversos outros que Crowe conheceu.
O guitarrista da banda, interpretado por Billy Crudup, foi inspirado em Glenn Frey, do Eagles, mas há cenas inspiradas em acontecimentos com outros astros do rock, como a que fala “eu sou um deus dourado” no telhado de uma casa, fato que ocorreu com Robert Plant, do Led Zeppelin.
O ator teve aulas de guitarra com Peter Frampton, mas quem gravou as músicas do filme foi Mike McCready, guitarrista do Pearl Jam. Além de servir como consultor musical da produção, Frampton teve uma pequena participação na tela como roadie do Humble Pie, sua banda do início dos anos 70.
Para criar o vocalista do Stillwater, o ator Jason Lee inspirou-se em Paul Rodgers, vocalista do Free e do Bad Company. A cena do avião no meio de uma tempestade ocorreu quando Crowe viajava com o The Who.
A personagem Penny Lane foi inspirada numa pessoa real, uma amiga do diretor. Há personagens que realmente existiram como Ben Fong-Torres, editor da Rolling Stone, e Lester Bangs, um dos mais famosos críticos de rock.
A trilha sonora traz um verdadeiro apanhado dos principais nomes do período, com mais de 50 canções, inclusive do Led Zeppelin, que raramente libera o uso de suas músicas para filmes.
Assim, Crowe não conseguiu o uso de “Starway to Heaven” para uma determinada cena, em que a canção seria tocada na íntegra. A cena está nos extras do DVD, mas sem a música.
Fica por conta do espectador colocá-la de fundo no seu aparelho de som. O custo de direitos autorais da trilha sonora foi de 3,5 milhões de dólares, em outras produções esse valor normalmente é inferior a 1,5 milhão.
O DVD traz duas versões do filme, a que passou nos cinemas e uma com 40 minutos a mais e com o título que Cameron Crowe havia imaginado inicialmente: Untitled (sem título), mas que foi vetado pela Dreamworks. Não há mudanças significativas no enredo dessa versão, somente algumas cenas estendidas e outras acrescentadas, que definem melhor os personagens.
Crowe adora o rock, é um verdadeiro fã, o que transparece em cada fotograma de uma das melhores homenagens já prestadas pelo cinema a esse gênero musical.
1972
Jovens querendo montar uma banda de rock existem em todos os lugares do mundo. No Brasil não seria diferente. Essa é a premissa básica de 1972, longa que conta a história do casal Snoopy e Júlia, sendo ele um músico iniciante e ela, uma aspirante a jornalista de rock. O filme, lançado em 2006, tem direção de José Emilio Rondeau, que assina o roteiro ao lado da sua esposa, a jornalista Ana Maria Bahiana.
É uma história contada por quem viveu a época. Como não poderia deixar de ser, a ditadura militar é um dos assuntos abordados, mas de forma muito superficial, talvez para não assustar os jovens com quem queria falar.
O filme tem alguns defeitos, a começar pelo fraco elenco, do qual só se salva Tony Tornado num bom papel coadjuvante. Por ser uma produção de baixo orçamento, não havia dinheiro para pagar os direitos de músicas internacionais e a trilha sonora ficou somente com canções nacionais – e mesmo assim com problemas, como a canção de Márcio Greyck, grande ídolo da música brega dos anos 70. Mas mais estranho é falarem tanto de Rolling Stones e não mostrar música alguma do grupo inglês na trilha.
O maior mérito do filme foi resgatar a banda carioca A Bolha, que até é interpretada no filme. Várias canções do grupo estão no longa, o que motivou uma reunião dos integrantes para alguns shows.
Detroit Rock City
A história acontece em 1973, mas poderia se passar em qualquer época entre aquele ano e hoje porque trata de fãs do Kiss. Não o fã comum, mas aquele que é capaz de fazer qualquer coisa para ver sua banda preferida.
Esse é justamente o tema de Detroit Rock City, de 1999, que conta a história de quatro jovens que precisam conseguir os ingressos de um show do Kiss na cidade de Detroit, após a mãe de um deles queimar os ingressos que tinham comprado. Como a lotação está esgotada, eles tentam de todas as formas conseguir entrar no show.
Essa comédia dirigida por Adam Rifkin contém vários exageros, mas era o que poderia se esperar quando o assunto é o Kiss. A história tem várias referências às músicas do grupo. O título é uma referência explícita à canção que a banda aparece tocando no final.
A trilha traz ainda sucessos de várias outras bandas, como AC/DC, T-Rex, Sweet, Thin Lizzy, Black Sabbath, Ramones, David Bowie e outros.
Divertido e despretensioso, foi um fracasso de bilheteria. Mas se você é um grande fã do Kiss, esse é o seu filme.
O Verão de Sam
Spike Lee dirigiu em 1999 esse interessante retrato do que aconteceu no verão de 1977 em Nova York. O Verão de Sam (Summer of Sam) mostra um painel de diferentes pessoas vivendo numa mesma vizinhança aterrorizada por um assassino serial chamado “O Filho de Sam”.
Outros acontecimentos somam-se a essa história, como o fato desse ter sido o ano mais quente da cidade até então, e um grande blecaute que provocou uma onda de saques.
Era a época do disco music e também do surgimento do punk. Essas duas vertentes musicais estão representadas na tela através dos dois casais principais da história.
O primeiro, formado por John Leguizamo e Mira Sorvino, que freqüenta as discotecas, veste-se de acordo com a moda da época e até tenta entrar no lendário Studio 54.
Os outros dois são Ritchie e Ruby, respectivamente, Adrien Brody e Jennifer Esposito. Em um dos seus primeiros papéis de destaque, Brody faz um jovem que se tornou punk recentemente e até imita o sotaque inglês mesmo nunca tendo saído dos EUA.
Quando começa a namorar Ruby, a garota também acaba virando punk, e os dois logo formam uma banda que chega a tocar no lendário CBGB, o templo nova-iorquino do punk.
O filme mostra os atritos gerados pelo encontro desses universos diferentes e a paranoia das pessoas tentando descobrir quem é o assassino. Ritchie, somente por ser diferente, torna-se o principal suspeito dos seus vizinhos.
Enquanto isso, o verdadeiro matador continua agindo. Apesar do que o título sugere, não é um filme sobre o “Filho de Sam”, mas sim sobre a reação que provocou na população na época.
A trilha sonora é composta na sua maior parte por clássicos da disco music, mas em dois momentos-chave a música é do The Who: as canções “Baba O’Reily” e “Won´t Get Fooled Again”.
Velvet Goldmine
Velvet Goldmine, dirigido por Todd Haynes em 1998, é o retrato do período do glam rock, ocorrido após o fim do sonho hippie e antes da revolução punk. O glam levava ao extremo a ideia de amor livre dos hippies enquanto a música continha elementos do som cru característico do punk.
Uma época em que tudo era permitido, homens e mulheres usavam maquiagens pesadas, joias e roupas espalhafatosas. Não havia distinção de gêneros, apenas o glamour importava.
Trata-se de uma ficção inspirada na vida de David Bowie, que não gostou do roteiro e não permitiu que nenhuma de suas canções fosse utilizada. A única que conseguiram foi a própria “Velvet Goldmine”, que não estava registrada.
A solução foi criar várias músicas novas, que são cantadas pelos próprios atores. Há também algumas composições conhecidas de Lou Reed, T-Rex, Gary Glitter e Brian Eno.
No enredo, o protagonista é Brian Slade (Jonathan Rhys-Meyers), que também tinha lá o seu Ziggy Stardust, personagem criado para estrelar seus discos. E se Bowie se envolveu com Iggy Pop, Lou Reed e Mick Jagger, Slade tinha Curt Wild (Ewan McGregor), figura que amalgamava todos os rock stars ao lado e ainda tinha alguns toques de Kurt Cobain.
A história e sua estrutura narrativa são inspiradas em Cidadão Kane: há um jornalista (Christian Bale) na década de 80 que tenta fazer uma matéria sobre Brian Slade, desaparecido após forjar sua morte.
À medida que vai reconstruindo a vida do astro, a realidade se mistura com seqüências de fantasia e videoclipes que lembram o que era produzido na época, beirando o kitsch.
Vários astros do rock se envolveram na produção do filme. Os integrantes do Placebo aparecem como músicos de bandas e gravaram uma canção de Marc Bolan para a trilha sonora. O personagem Brian Slade possui um grupo chamado Venus in Furs, o mesmo nome da famosa canção do Velvet Underground.
No disco da trilha sonora, os músicos da banda são Thom Yorke, Jonny Greenwood (ambos do Radiohead), Bernard Butler (Suede), Andy Mackay (Roxy Music). A banda de Curt Wild é formada no disco por Ron Asheton (Stooges), Mark Arm (Mudhoney), Thurston Moore e Steve Shelley (ambos do Sonic Youth).