ZECA BALEIRO – Underground sob o chão de estrelas
Crônica da Era do Rock, por Rodrigo Leste
Falar de um artista vivo e em plena atividade é sempre complicado. Hoje o cara tá assim, amanhã tá assado. Mas, vamos lá! Quando ouvi Baleiro pela primeira vez andava meio desiludido com os novos compositores(as)/cantores(as) que pintavam na cena musical brasileira. Fazia até um certo esforço pra curtir o som de alguém que me foi indicado como “uma joia rara que pintou na MPB”. Escutava e, de um modo geral, achava que o tal som não passava daquilo que meu amigo, o escritor Jeter Neves, define como “mais do mesmo”. Ouvia o tal som e sentia saudades de Os Mutantes, dos Novos Baianos, de Naná Vasconcelos, de Gal Costa e outros artistas que não canso de ouvir com renovado prazer.
E aí fui escutar o primeiro CD de Zeca Baleiro (José Ribamar Coelho Santos, olha o Ribamar do Maranhão aí!)
— Opa! Gostei demais!
O maranhense trazia novos ares pra mesmice constante que varrem os streams. Ritmos inusitados, arranjos ousados, letras criativas, composições que estão muito acima da média das que as mídias derramam por aí. Gostei pra valer. Senti o mesmo barato que a música do fantástico Luiz Melodia me proporciona. Aliás, de cara, incluí ZB no mesmo time dos craques que estão sempre rodando na minha vitrola.
Uma vez fui apresentado a ele por outro amigo escritor, Sérgio Fantini. Na época, Sérgio trabalhava num órgão municipal de cultura que estava promovendo um show do Baleiro em BH. Nos encontramos num restaurante no Edifício Central, perto da praça da Estação. Foi só um “Hello, Good Bye”, mas o cara me pareceu uma pessoa simples e simpática, um rapaz latino-americano, como diria Belchior.
Canções como Heavy Metal do Senhor (“O cara mais underground que eu conheço éodiabo”, lembra?) trazem oxigênio pra fazer a mesmice ser soprada e pintar novos ares no céu musical do Brasil (“que no inferno toca cover das canções celestiais”). O primeiro álbum de ZB, “Por Onde Andará Stephen Fry?” é cheio de criatividade e bossa. A começar pelo título: quem é Stephen Fry?
Cheguei a pensar que era um personagem inventado por Zeca mas, pesquisando, vi que Stephen Fry é um ator, comediante, escritor, apresentador de televisão e radialista inglês. Sua carreira é marcada pela versatilidade, tornando-o uma figura reconhecida e admirada no Reino Unido e internacionalmente. Detalhe importante: Stephen apoia a causa Palestina.
Zeca criou o título do disco e a canção “Por Onde Andará…” ao ler uma notícia, publicada na Folha de S.Paulo, sobre o suposto desaparecimento do ator inglês Stephen Fry depois de uma crítica negativa a sua atuação numa peça de teatro em Londres.
O álbum de estreia de ZB, além de Heavy Metal…, traz excelentes canções como Flor da Pele, onde ZB dialoga com a icônica Vapor Barato (Macalé/Wally Salomão), Mamãe Oxum (de Mariene de Castro) uma espécie de ponto de umbanda em que Baleiro conta com a participação de Chico Cesar. Outra participação especial no disco é de Genival Lacerda, figura folclórica da MPB, que aparece na música O Parque de Juraci.
Em 1999, ZB lança outro álbum porreta: Vô Imbolá. Na sequência apresenta Lírica, Pet Shop Mundo Cão e, mais adiante, O Coração do Homem Bomba (2008). Estes são os discos dele que mais me agradam.
Manter a regularidade em uma produção tão vasta quanto a de ZB é difícil. Existe um momento em que qualquer artista começa a se repetir de maneira inconsciente. Exatamente por isso o grande Picasso é um artista genial. Criava estilos inusitados e logo, sem mais aquela, rompia com tudo e vinha com outras propostas, mais inusitadas ainda. Mas Picasso é Picasso, gênio, incomparável.
Baleiro produziu álbuns em parceria com Fagner, Chico Cesar, Vinícius Cantuária e Zé Ramalho. E muito legal foi a sua sacada de resgatar a obra de Sergio Sampaio, um dos grandes injustiçados da MPB. Zeca Baleiro foi o responsável pela produção do álbum póstumo de Sérgio Sampaio, “Cruel”, lançado em 2006. Ele recebeu gravações inéditas de Sampaio da sua ex-esposa e fez um trabalho de recuperação dos áudios. ZB contou com a participação de Sérgio Natureza, Charles Gavin e Rodrigo Moreira, biógrafo de Sérgio Sampaio, na realização do projeto.
Baleiro, com 59 anos, tem ainda muita lenha pra queimar. Já lançou cerca de 30 álbuns. Produz literatura, dramaturgia e compôs trilhas pra teatro e cinema. Olho nele, pois é um dos artistas mais criativos deste Brasil de todos nós.
Se quiser promover um evento com ele é só ir no site: https://zecabaleiro.com.br/
Pitacos e revisão: Hilário Rodrigues
Colaboração midiática: @rodrigo_chaves_de_freitas
Portal Cultural Caleidoscópio: siga @caleidoscopiobh
Para ler mais crônicas, acesse: https://caleidoscopio.art.br/category/cultural/cultural-musica/cronicas-musicais/
