Vanguardas Artísticas | Expressionismo nas artes plásticas
Texto: Cristina Tolentino
cristolenttino@gmail.com
Nascimento do expressionismo
O expressionismo nasceu na Alemanha, nos anos que seguem a Primeira Guerra Mundial (na época de 1910). Época em que o espírito germânico busca se recompor do desmoronamento do sonho imperialista de Guilherme II.
Um período histórico, turbulento e decisivo, abrangendo a Primeira Guerra Mundial, a Revolução Russa, a busca de instauração de uma república socialista na Alemanha, a instauração do regime burguês da república de Weimar.
Nas palavras do abismo
Em 1916, Hermann Bahr traduz sobre o pesadelo de uma época difícil. Nas palavras dele, diz o seguinte:
“Nós não vivemos mais, somos vividos. Não temos mais liberdade, não sabemos mais nos decidir, o homem é privado da alma, a natureza é privada do homem…Nunca houve época mais perturbada pelo desespero, pelo horror da morte. Nunca silêncio mais sepulcral reinou sobre o mundo. Nunca o homem foi menor. Nunca esteve mais irrequieto. Nunca a alegria esteve mais ausente, e a liberdade mais morta. E eis que grita o desespero: o homem pede gritando a sua alma, um único grito de angústia se eleva do nosso tempo. A arte também grita nas trevas, pede socorro, invoca o espírito: é o expressionismo.”
Em seguida, em 1917 Kasimir Edschmid completa o momento:
“O artista expressionista transfigura assim todo o espaço. Ele não olha: vê; não narra: vive; não reproduz: recria; não encontra: busca. A concatenação dos fatos – fábricas, casas, doenças, prostitutas, gritos e fome – é substituída por sua transfiguração. Os fatos adquirem importância somente no momento em que a mão do artista, estendida através deles, fechando-se agarra aquilo que está por trás deles: o artista vê o humano nas prostitutas e o divino nas fábricas, e reintegra cada fenômeno no conjunto do mundo”.
(…) “Uma prostituta não é mais retratada arrumada e maquilada da forma como a sua profissão exige. Ela aparecerá sem perfumes, sem cosméticos, sem bolsinha, sem perna balançando, mas a natureza do seu caráter deverá sobressair de uma forma tão viva na simplicidade da forma que resultará saturada de todos os vícios, paixões, baixezas e tragédias com que são feitos o seu coração e a sua profissão. Não importa conhece-la em sua existência cotidiana: o chapéu, o andar, os lábios são apenas derivativos que não esgotam a essência do seu caráter. O mundo já existe, não teria sentido fazer uma réplica dele; a principal tarefa do artista consiste em indagar seus movimentos mais profundos e seu significado fundamental, e em recriá-lo. Cada homem não é mais um indivíduo ligado ao dever, à moral. À sociedade, à família: nessa arte, ele se torna apenas uma coisa, a maior e a mais mísera, torna-se homem”:
(…) “situado no cosmo, porém com sensibilidade cósmica; não se preocupa em viver a sua vida: atravessa-a; não reflete sobre si mesmo, mas vive si mesmo, não vagueia às margem das coisas, colhe-as bem no centro. Não é desumano nem tampouco super-humano, é apenas homem, covarde e forte, válido e vil, bom, banal, magnífico, assim como Deus o deixou no momento da criação. As coisas estão todas perto dele, acostumado como está a perscrutar o seu significado e a sua essência autêntica. Não tem inibições, ama e combate de forma direta; apenas a força do seu sentimento o guia e o dirige, não um pensamento contaminado. Portanto, pode chegar a exaltar-se, a fazer nascer em seu espírito grandes visões.”
James Ensor – “A Intriga”
Capa da revista DIE BRÜCKE, marco do aparecimento do expressionismo no seu primeiro período.
Primeiro grupo de expressionistas
O expressionismo é o caminho para uma concepção existencial da arte: colher, na realidade, sob o invólucro do transitório, o núcleo eterno, imutável da própria arte. Golpear o centro da realidade, não permanecer em sua periferia. Pressionar a realidade para dela fazer brotar o latente secreto.
Daí surge a típica deformação expressionista, que encontramos principalmente nas obras de Van Gogh (1853-1890), Edward Munch (1863-1944) e James Ensor (1860-1949), que maior influência exerceram sobre os expressionistas alemães.
Munch expôs em Berlim, no ano de 1892, apresentando cinqüenta e cinco obras de sua autoria. Van Gogh, Gauguin e Cézane, em Munique no ano de 1904; Van Gogh na cidade de Dresden, em 1905, e em Berlim no ano de 1908.
Em 1904, foi fundado em Dresde, o primeiro grupo de expressionistas, com o nome de Die Brucke (A Ponte). Alguns artistas que participaram deste grupo: Ernst L. Kirchner (1880-1938), Karl Schmidt (1884), Erich Heckel (1883-1970), Emile H. Nolde (1867-1955), Max Pechstein (1881-1955).
A primeira exposição deste grupo aconteceu em 1906 e a primeira manifestação conjunta em 1913. Na arte destes artistas predominava o vivido sobre o visto. A sua pintura nunca é agradável, hedonista, brilhante. Ao contrário, nela está sempre presente algo de estridente, de grosseiro, de híbrido. “Não acreditem nesta civilização”, gritam os personagens expressionistas de Nolde.
Marco no expressionismo
No quadro “O Grito” de Munch, que encontramos um grande marco do expressionismo. A deformação da figura chegou a um limite desconhecido para a época. O homem em primeiro plano, com a boca em grito e as mãos pressionadas sobre os ouvidos para não escutar o próprio grito incontido, que é também grito da natureza, reduz-se a uma mísera aparência ondulante numa paisagem de delírio. Tudo está voltado para a expressão: desenho, cor, composição. Munch diz: “ouço o grito da natureza”.
O expressionismo, da forma como ele se articulou dentro da história da arte moderna, aparece como o movimento mais rico e complexo. Em grande parte, podemos dizer, a arte moderna está mergulhada numa “condição expressionista”, pois a maior parte dos artistas contemporâneos sentiram e sentem os temas do expressionismo como seus.
Assim, podemos dizer, que o movimento expressionista, em seu conjunto não foi um movimento “formalista”, mas de “conteúdos”. Um movimento que integrou em si todas as expressões artísticas, nas suas mais diversas manifestações e que até hoje nos traz o eco do seu grito: o grito da alma humana.