Crônica Vladimir Maiakovski
Crônicas Musicais

Crônica Vladimir Maiakovski

VLADIMIR MAIAKOVSKI – O poeta que conversava com o Sol

Crônica da Era do Rock, por Rodrigo Leste

Qual letrista não gostaria de adicionar pitadas da poesia de Vladimir Maiakovski nas suas composições? É o mesmo que um pintor que gostaria de aplicar em suas telas pinceladas com o ímpeto de Van Gogh. Maiakovski, o gigante russo, em estatura (1,90) e no tamanho do alcance de sua poesia, é, sem dúvida, um dos grandes ícones artísticos mundiais. Ele viveu um dos períodos mais turbulentos da história universal: a Revolução Russa de 1917. Esteve no front dos acontecimentos que tiraram o povo russo de séculos de atraso e miséria, sob o signo dos czares, e abriu as portas para os novos tempos. A revolução trazia a esperança de promover justiça social, acabar com as enormes desigualdades econômicas, pôr comida em todas as mesas, trazer diversão e arte pra toda a gente. E mais: propunha transformar a esquálida nação agrícola numa grande potência industrial.

Maiakovski mergulhou de cabeça no projeto de fazer acontecer a revolução. Trocou sua severa disciplina de dedicar-se quase que integralmente ao ato de poetar, pelas atividades dedicadas à propaganda e criação de uma consciência revolucionária. A militância política de VM vem de longe. Em 1909 passou quase um ano preso por ter participado de uma tentativa de libertação de presos políticos. Foi justamente no cárcere que leu os grandes clássicos russos: Dostoievski, Tolstoi, Gogol, Pushkin – além disso, escreveu ali alguns de seus poemas.

Juntamente com o pintor e poeta David Burliuk e outros artistas, lança, em 1912, o manifesto “Bofetada no Gosto Público”, criando o movimento cubo-futurista russo. O movimento russo diferenciava-se muito do futurismo surgido na Itália, sob a direção de Marinetti. Enquanto este passou a defender abertamente a guerra imperialista (e tempos depois o fascismo de Benito Mussolini), os futuristas russos abraçaram a Revolução de Outubro de 1917. Versos de Maiakovski eram cantados pelos soldados do Exército Vermelho enquanto ocupavam o Palácio de Inverno: “Come o ananás, mastiga a perdiz,/Teu dia está chegando, burguês!”.

Durante a guerra civil, entre 1918 e 1921, esteve à frente da Rosta (Agência Telegráfica Russa), pintando inúmeros cartazes de agitação e propaganda. Essas obras promoviam os ideais socialistas, incitando o povo a lutar contra os inimigos, internos e externos, da revolução. Manteve contatos estreitos e projetos paralelos com outros grandes nomes da arte soviética, como Máximo Gorki, Serguei Eisenstein e Dziga Vertov, o compositor Shostakovich e o dramaturgo Meyerhold.

Em 1925, viajou pela Europa, Estados Unidos, México e Cuba, registrando suas impressões em poemas num livreto de histórias cáusticas: Minha Descoberta da América. Escreveu roteiros para cinema e chegou a atuar em alguns filmes. Nos três últimos anos de vida completou duas peças satíricas: Klop (O Percevejo), encenada em 1929, criticando o tipo de crápula que emergiu com a nova política econômica na União Soviética, e Banya (A Casa de Banho), apresentada em Leningrado a 30 de janeiro de 1930, paródia sobre a estupidez burocrática e o paranoico oportunismo do regime sob Joseph Stalin.

Durante sua estada em Paris (1928), apaixonou-se pela refugiada Tatiana Yakovleva, com quem queria se casar, mas que o recusou. Na mesma época, teve desentendimentos com a dogmática Associação Russa de Escritores Proletários e autoridades soviéticas. Frustrado no amor, cada vez mais marginalizado da realidade partidária, e tendo um visto negado para viajar ao exterior, passou a sofrer de terríveis crises de depressão, mas continuou sendo a figura mais dinâmica do cenário literário soviético. Sua obra influenciou muitos poetas russos e estrangeiros. Num lampejo de lucidez, Stalin o declarou “o melhor e mais talentoso poeta de nossa época soviética”.

Após concluir o poema “A Plenos Pulmões” e advertir sua atual companheira, Nora, dos perigos de sua extrema depressão, suicidou-se em sua casa na praça Lubianka, em Moscou, dando um tiro no peito. Era abril de 1930 e ele tinha 36 anos. Seu bilhete de despedida termina assim:

” …O barco do amor

espatifou-se na rotina.

Acertei as contas com a vida

inútil a lista

de dores,

desgraças

e mágoas mútuas.

Felicidades para quem fica.” (VM)

Segue trecho de um dos poemas de Maiakovski que mais gosto:

A FLAUTA-VÉRTEBRA

A todas vocês,

que amei e que eu amo,

ícones guardados num coração-caverna,

como quem num banquete ergue a taça e celebra,

repleto de versos levanto meu crânio.

Penso, mais de uma vez:

seria melhor talvez

pôr-me o ponto final de um balaço

Em todo caso

eu

hoje vou dar meu concerto de adeus.

Memória!

Convoca aos salões do cérebro

um time inumerável de amadas.

Verte o riso de pupila em pupila,

veste a noite de núpcias passadas.

De corpo a corpo verta a alegria.

Esta noite ficará na História.

Hoje executarei meus versos

na flauta de minhas próprias vértebras.

Colaboração: Blog O Suicidário (clique para acessar)

https://osuicidario.blogspot.com/2012/06/vladimir-maiakovski.html?fbclid=IwY2xjawFr1tVleHRuA2FlbQIxMAABHf5nDDW032xY0u1j31j9it0_Qi0CxBc4QflXq5RcQaQ4YfZ0BI8XGhYd0w_aem_onC9uavbVyvhfDYzdT-vuA

Revisão: Hilário Rodrigues

Colaboração midiática: @rodrigo_chaves_de_freitas

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