BORN TO BE WILD – hino da rebeldia
Crônica da Era do Rock, por Rodrigo Leste
Hoje não vou escrever sobre algum compositor ou intérprete; a estrela do dia é uma música, uma emblemática canção que traduz todo o espírito do rock and roll. Ouvir esse som é sentir o vento da liberdade batendo no rosto, é vislumbrar a longa estrada se abrindo, feminina, para que nela se penetre. E não dá pra desvincular a música sobre a qual estou falando, Born to Be Wild, da inesquecível cena de Easy Rider (Sem Destino), quando o personagem vivido por Peter Fonda, montado numa Harley-Davidson FLH, tira o relógio do pulso, olha pra ele e o atira no chão. Depois, junto com Dennis Hopper, que pilota outra Harley-Davidson, acelera, e ambos seguem céleres pela estrada afora ao som de Born to Be wild. Legal demais!
Born to Be wild foi composta pelo guitarrista canadense Mars Bonfire, que, pelo que me consta, não ganhou nenhuma importância pelo fato de ser o autor dessa excelente canção (deve ter levado uma boa grana pelos direitos autorais e de rendimentos obtidos através dos diversos comerciais que se utilizaram da música). Mars, já falecido, é irmão de Jerry Edmonton, que era o baterista do Steppenwolf. Nos primórdios, em Toronto, Canadá, a banda tocava com o nome de Sparrow. John Kay, imigrante da Alemanha e seus asseclas, depois de passarem por Nova York e Los Angeles, mudaram-se pra San Francisco, onde a banda passou a usar o nome que a consagrou: Steppenwolf, certamente inspirado no livro homônimo de Herman Hesse.
Tendo assistido Easy Rider e vibrado com Born to Be wild, pus muitas esperanças no som do Wolf, mas tirando The Puscher e Magic Carpet Ride, pouco se aproveita de um repertório constituído de músicas muito parecidas entre si e que no final das contas não acrescentam quase nada. Como diria um amigo meu, o escritor Jeter Neves: “mais do mesmo”.
Capítulo à parte é The Puscher (O Traficante) composta pelo ator e cantor country Hoyt Axton. A música em si é bacana, tem um belo arranjo, mas a letra ultrapassa as barreiras da tolerância zero em relação ao tráfico de drogas e propõe ações que trazem o ranço de fascismo consumado (que fique claro que não vejo com bons olhos o “cabeção”, tipos quase sempre abomináveis), mas daí dizer que “se fosse o presidente dessa terra iria declarar guerra ao traficante/iria cortá-lo se estivesse em pé e atiraria nele, se corresse.” E mais: “Iria matá-lo com minha Bíblia, minha navalha e meu revolver.” Reagan, Nixon, certamente aprovariam esse raivoso discurso, que é detestado por 9 entre 10 malucos. E esse foi um dos hits do Steppenwolf… Certamente, uma letra dessas envergonharia o espiritualista Herman Hesse.
Mas voltando à poderosa Born to Be wild, temos ali todo o vigor do verdadeiro rock and roll, somado a grandes doses de irresponsabilidade, descompromisso, desapego e “vamos botar pra fuder! ” Dialoga com ícones da rebeldia como os filmes de James Dean, traz uma pitada de Na Natureza Selvagem, remete a Woodstock como um marco do paz e amor, lembra a grandeza de My Generation, do The Who e a radical Kick Out The Jams, do MC5. Parece com um monte de coisas e no entanto, é única e original. Com certeza entra na minha lista dos melhores rocks já compostos e performados em todos os tempos.
Salto de novo para o filme Easy Rider, pegando agora o seu final. Peter e Dennis seguem por uma tranquila estrada do interior da América. Surge uma camionete que transporta dois brancos, tipos de aspecto comum, talvez fazendeiros, que carregam seus poderosos rifles na cabine do veículo. Passam por Dennis Hopper que dá uma encarada neles e estende o dedo médio sem constrangimento. O cara que estava no banco do carona já tinha o rifle na mão e dispara tiro certeiro que pega em cheio no motoqueiro. Depois, é a vez de Peter Fonda receber chumbo grosso; sua moto, desgovernada, explode. Uma bola de fogo subindo pelos ares dá ponto final ao enredo, que trouxe a história de dois malucos que se atreveram a ir na contra mão do american way of life e não foram perdoados pelos dignos representantes dos três ks da Ku Klux Klan. Na trilha sonora, no encerramento do filme: a partir do primeiro verso de Bob Dylan, Roger McGuinn do Birds, compôs e interpreta a lamentosa Ballad to the Easy Rider. O recado foi dado, quem viver verá: (RE)BORN TO BE WILD! Yeaaahhh!!!
Revisão e pitacos: Hilário Rodrigues
Colaboração midiática: Rodrigo Chaves de Freitas
@caleidoscopiobh (Portal Cultural Caleidoscópio)
Consultoria Musical: Marcos Kacowicz
Para conhecer mais os filmes de rock no cinema, acesse: www.caleidoscopio.art.br/category/cultural/cultural-musica/historia-do-rock-no-cinema/
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