Crônica John Coltrane
Crônicas Musicais

Crônica John Coltrane

CHOREI QUANDO OUVI O SOM DE JOHN COLTRANE PELA PRIMEIRA VEZ

Crônica da Era do Rock, por Rodrigo Leste

Ainda meio adolescente, com uns 16 anos, comecei a ser aplicado em rock de primeira: Stones, Jefferson Airplane, Cream, The Doors. Mas, na mesma época pintaram as primeiras audições de jazz, som que me soava totalmente novo, estranho e inquietante. O poeta Sérgio Gama, nessa época, esteve nos States participando de um desses convênios para estudantes e chegou de lá trazendo o sopro da Revolução. Sérgio, muito elétrico e falante, encontrou em mim um ouvinte atento e interessado na sua retórica repleta de rebeldia e contravenção. Todos os valores que me foram apregoados desde a infância foram revirados de pernas pro ar. Passei a enxergar na figura do “burguês” o real inimigo.

A trilha sonora dessa senda revolucionária passava pelos grandes ícones do jazz: Miles Davis, Archie Shepp, Pharoah Sanders e o mais apreciado de todos: o fabuloso John Coltrane que era, para nós, uma espécie de Mao Tsé-Tung do som. Charlie Parker, Thelonius Monk, Albert Ayler e até Sun Ra também entravam no nosso cardápio musical. Era para mim difícil ouvir e apreciar esse gênero musical, mas “não pegava bem” pular fora das sessões que rolavam com Sérgio de DJ, e confessar que preferia escutar um básico Jumping Jack Flash.

Aos poucos fui me acostumando às livres improvisações, à quebra de paradigmas musicais, às jam sessions, aos solos longos, ao som nervoso e aflito emitido pelos saxofones e trompetes, às batidas quebradas das baterias, aos pianos e baixos tecendo inéditas harmonias, pintando quadros musicais que dialogavam com o experimentalismo de Picasso, de Dali ou a ousadia de Jackson Pollock.

Estávamos vivendo os anos de chumbo. O famigerado AI5 imposto pela ditadura militar vinha para acabar com qualquer perspectiva de liberdade. A saída era pegar em armas, ingressar na guerrilha, na luta clandestina, como muitos fizeram e pagaram com suas próprias vidas, além das torturas e mutilações diversas. Não tivemos peito pra dar esse passo radical e sem retorno. Nos apegamos ao barato da revolução através da arte, da cultura e acabamos baixando na mítica cidade americana de Ann Arbor, Michigan, onde viviam os heróis do modelo de revolução que nos era conveniente (menos risco e perigos): Rock and Roll Revolution, capitaneada pelo poeta John Sinclair e o MC5, banda de rock pauleira — Kick out the jams, motherfucker!! Esse pessoal vivia em comunidade, tinha um partido político, o Rainbow People’s Party, ligado aos radicais do Poder Negro, o Black Panthers Party.

Depois dessa empolgante e determinante passagem pe criei grupos de teatro, montei e apresentei peças — Quando os Beatles Tocarem Juntos Outra Vez e Tudo Certo, Mas Tá Esquisito —, lancei livros — A Infernização do Paraíso e Monstro da Perfeição —. O jazz sempre me acompanhou nessas andanças. Tive a oportunidade de assistir Archie Sheep e Fredie Hubard em Paris, assisti Sun Ra em Munique; no Brasil assisti Paulo Moura, Hermeto Pascoal, Márcio Montarroyos e outros craques.

Ouço música em boa parte do meu dia. Meu repertório é eclético: clássico, world music, rock, MPB, baião, chorinho, ambient music e o jazz que me traz aos ouvidos mestres como Winston Marsalis, Carla Bley, Dorothy Ashby, Alice Coltrane, Eric Dolphy, Ornette Coleman, Charles Mingus, Pat Metheny, Wes Montgomery, Charlie Haden e muitos mais, incluindo Gato Barbiere. Então, viva a música, viva o jazz!

Segue link de uma pérola: o disco Virgin Beauty de Ornette Coleman em parceria com o guitarrista Jerry Garcia (Grateful Dead): https://www.youtube.com/watch?v=r9c8OQxz_So

Revisão e pitacos: Hilário Rodrigues

Colaboração midiática: @rodrigo_chaves_de_freitas

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Para ler mais crônicas, acesse: https://www.caleidoscopio.art.br/category/cultural/cultural-musica/cronicas-musicais/

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