PETER GABRIEL, DAVID BYRNE e a World Music (Música do Mundo)
Crônica da Era do Rock, por Rodrigo Leste
Meu primeiro contato com a World Music (Música do Mundo) deu-se através de Peter Gabriel na trilha sonora que compôs para o filme A Última Tentação de Cristo, de Martin Scorcese, baseado no romance do grego Nikos Kazantzákis. William Dafoe, esse baita ator, interpreta lindamente o papel de Jesus e quem faz Pôncio Pilatos no filme é ninguém menos do que David Bowie. A trilha de PG é calcada em ritmos e melodias do Oriente Médio e do Norte da África, transcendendo em muito os limites da Galileia. A banda sonora ajuda a criar um clima místico que dialoga com a vertigem e o estranhamento com que Jesus Cristo se relacionava com o mundo. O álbum produzido por Peter Gabriel ganhou o Grammy de Melhor Disco de New Age em 1990.
O álbum marca o lançamento do selo Real World, de Peter Gabriel, dedicado a produção, venda e divulgação de músicas de todas as partes do planeta. Através dele, nomes, como a banda africana Farafina aparecem no mesmo catálogo que o paquistanês Nusrat Fateh Ali Khan ou os americanos The Blind Boys of Alabama.
No mundo globalizado, abraçado por vários streamings musicais como o Spotify, Apple ou Amazon, a circulação de informações e criação artística ultrapassa fronteiras e permite o diálogo entre todas as línguas e culturas. Bom pra todo mundo, pois a disseminação da World Music cria pontes e aproxima belezas que eram anteriormente desconhecidas e ignoradas.
Cabe aqui lembrar a importância de outro músico: David Byrne (Talking Heads) que, viajando por diversas partes do planeta, gravou e lançou talentos que não obtinham brilho e nem reconhecimento em seus próprios países de origem. Tom Zé é o caso mais notório, quando da passagem de DB pelo Brasil. Tom estava para desistir de sua carreira musical, voltar para sua cidade natal, no interior da Bahia, e se tornar frentista num posto de gasolina. A aparição de Byrne, evitou que isso viesse a acontecer! Através da intervenção de DB, Tom Zé engrenou novamente sua carreira, fazendo sucesso no Brasil e no mundo.
David Byrne escreveu uma matéria intitulada: “Detesto a World Music!” Em um longo e sofisticado texto tenta mostrar a manipulação da música produzida na periferia do Primeiro Mundo, pelas grandes gravadoras e distribuidoras que criam um nicho cultural, o da “submúsica”, ou seja, aquela que não é produzida na Europa e nos EUA. Este e outros questionamentos procuram mostrar que a “World Music” era mais um instrumento de dominação dos brancos, ocidentais, colonialistas, que se apossam da música produzida em regiões remotas por artistas pobres. Por preço de banana, os empresários gringos apoderam-se dos royalties, direitos de edição, etc e tratam o som como mera curiosidade folclórica tipo “macumba pra turista”, termo criado pelo poeta modernista Oswald de Andrade, para designar grotescas picaretagens e safadezas em geral.
A polêmica rendeu e a revista Rolling Stone noticiou: “Grammy renomeia categoria de World Music para evitar ‘conotação de colonialismo’. Em meio aos debates de colonialismo e racismo presentes na cultura, o Grammy anunciou que a categoria foi renomeada para Melhor Álbum de “Global Music” (“música global”, em português) para garantir um ‘termo mais inclusivo’.”
Independente de ser “Global Music” ou “World Music”, o gênero me agrada e traz para a superfície artistas e estilos que anteriormente circulavam apenas em limitados guetos. Peter Gabriel e David Byrne, sejam como músicos ou produtores, têm enorme importância na disseminação da boa música que vem de diversas partes deste vasto mundo. Viva!
Revisão: Hilário Rodrigues
Colaboração midiática: @rodrigo_chaves_de_freitas
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Para ler mais crônicas, acesse: https://www.caleidoscopio.art.br/category/cultural/cultural-musica/cronicas-musicais/
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