As Origens da Comédia Grega
Teatro Grego Parte2

As Origens da Comédia Grega

História do Teatro |  As Origens da Comédia Grega

Texto: Cristina Tolentino
cristolenttino@gmail.com

 

As Origens da Comédia Grega

Cena da Comédia Nova: ao centro, um flautista

Cena da Comédia Nova: ao centro, um flautista

Também a comédia emanou de cerimônias dionisíacas, já não do ditirambo, mas de festividades que se realizavam desde tempos recuados em Atenas e na Ática e por Aristóteles denominadas procissões phalliká, ou kómos.

A comédia seria, portanto, o “canto do kómos”, ato burlesco, mas ainda assim religioso, relacionado ao mesmo tempo com os ciclos da agricultura e a idéia da reprodução. Em sua forma ateniense, porém, o gênero veio de uma confluência de tradições, visto que são numerosas as alusões a outros tipos de farsas no território grego, principalmente nas regiões e cidades dóricas, inclusive Megara, e traços delas se lhe devem ter agregado.

Aristóteles nos diz que a Comédia se originou dos cortejos fálicos, isto é, dos cortejos em que, sobre uma vara, era transportado enorme falo (órgão sexual masculino). Cortejos de parodiantes, muitas vezes mascarados de animais, que dançavam e cantavam e improvisavam chistes e duestos contra os circunstantes.

Teria sido um filho da cidade de Megara, Susárion, o primeiro a organizar um coro cômico no distrito ático de Icária, assim informa a crônica-inscrição de Paros (Marmor parium). A veia cômica dos dórios inspirou também uma primeira escola grega de comédia, de relativa importância, que floresceu longe da metrópole, na Sicília, onde Epicarmo (c.530-c. 440 a.C.) granjeou a fama de fundador do gênero no mundo grego.

“Estas representações eram essencialmente corais e não tardaram a deixar de ser improvisadas: os poetas elaboravam mais cuidadosamente as partes melódicas e tratavam temas sérios sobre literatura ou sobre política, na parte em que se dirigiam aos espectadores, isto é, na parábase, que se tornou característica regular da Comédia Antiga”. (George E. Duckwort, The nature of Roman Comedy, Princeton, 1971).

A regular inclusão da comédia nas competições teatrais de Atenas aconteceu em 488/7 a.C., quando, nas Grandes Dionisíacas daquele ano, coube o prêmio a Quiônides, de quem se conhecem os títulos de quatro peças. Em seguida foi cultivada por outros autores, dos quais Aristófanes dá notícia em famosa passagem de Os Cavaleiros onde enumera os seus predecessores e lastima o descaso que lhes votara o público.

Estrutura e Períodos

O coro da comédia compunha-se de 24 coreutas (o trágico de 13 a 15), em muitos casos representando animais. Suas danças e cantos eram vivazes e picantes, conforme o que dele se conhece pelas obras de Aristófanes, em contraste com a ação lenta e solene do coro trágico.

Ainda pelo modelo de Aristófanes, a primeira comédia ateniense teve a seguinte estrutura:

1. um prólogo para atores, com a exposição dos acontecimentos;
2. o párodo, intervenção inicial do coro;
3. o ágon, disputa, debate vivaz, entre os personagens, como entre o Argumento Justo e o Argumento Injusto, em As Nuvens;
4. a parábase, coro característico, em que os seus elementos ou o corifeu se dirigiam aos espectadores, a propósito da ação da peça ou abordando assuntos com ela não relacionados imediatamente;
5. uma seqüência de breves episódios;
6. o êxodo, intervenção final do coro, por vezes na forma de banquetes, matrimônio, etc.

Das origens ao declínio

Das suas origens ao declínio, a comédia ateniense teve três períodos bem delineados:

Comédia antiga

Aristófanes é o seu autor mais importante, mas conhecem-se os nomes de outros, como Cratino, Êupolis, Crates, Ferécrates e Magnes. De Êupolis recuperou-se, neste século, parte substancial da comédia Démoi, que se juntou a fragmentos existentes de outras peças.

O período estendeu-se aproximadamente, de 500 a 400 a.C. e caracterizou-se pela sátira política e pelos ataques pessoais violentos. A fábula da comédia admitia personagens da vida contemporânea de Atenas, com o uso abundante do coro e da parábase.

Comédia intermediária

Fase de transição em que o coro desaparece. Pluto, de Aristófanes, é classificada neste período, que tem a vigência de 400 a 330 a.C. A ele pertenceram Aléxis e Antífanes. Fontes antigas (Sobre a Comédia – De comédia, de autor não conhecido) aí situaram 57 escritores e 607 obras.

Comédia nova

Menandro foi o autor mais significativo do período, iniciado por volta de 330 a.C.. Sua duração correspondeu à supremacia meredônica na Grécia. Além dos textos de Menandro, há fragmentos de Dífilo e Filémon. Na comédia nova, ocorreu profunda mudança nas características do gênero. A fixação de tipos e de costumes substituiu a sátira.

Comédia Antiga - Aristófanes

comédia aristofanes

Também com Aristófanes (Aristophánes) a ausência de dados não permite reconstituir com segurança uma biografia, podendo-se oferecer os anos de 450 e 380 a.C. como os limites prováveis da sua existência.

Seu pai, Filipos, tinha propriedades na ilha de Egina, isto é o que deixa entrever nas suas peças. Cidadão adotivo ou filho legitimo de Atenas, foi testemunha de uma das mais críticas fases da cidade e do mundo grego em geral, a Guerra do Peloponeso, que se reflete diretamente em bom número das suas comédias. São colocados em debate, na sua obra, problemas específicos do teatro grego, tanto da comédia como da tragédia, discutidas como coisa urbana de rotina.

Juízos sobre os autores de tragédia são freqüentemente expressos, em parte desfavoráveis, tal como acontece em relação a Eurípedes, considerado por Aristófanes como inferior a Ésquilo e a Sófocles. O terceiro entre os grandes da tragédia é objeto da mais cáustica verve do seu colega da comédia.

Há consenso em situar Aristófanes como partidário da facção ateniense adversa a democracia e a guerra que se travava, defensor declarado que era dos interesses da classe de proprietários de terras e do tradicionalismo. Daí nasceria o seu desgosto por Eurípides, em cujas mãos a tragédia se tornara instrumento de tácito exame dos costumes e de revisão da filosofia e da religião do seu tempo.

Escreveu quarenta e sete comédias, das quais onze chegaram até nós: Os Acarnienses (enc. 425 a.C.), A Paz (enc. 421 a.C.) Lisístrata (enc. 411 a.C.), Os Cavaleiros (enc 424 a.C.), As Nuvens (enc. 423a. C.); A Assembléia das Mulheres (enc. 392 a.C.), Pluto (enc. 388 a.C.), As Rãs (enc.405 a.C.), Os Pássaros (enc.414 a.C.), As Vespas (enc.422 a.C.), As Festas de Ceres e Proserpina (enc.411 a.C.).

A guerra e a paz em Atenas afloram desde logo em Os Acarnienses (Acharnês), cujo protagonista, Diceópolis. parte para estabelecer com Esparta uma paz individual. Reaflora em A Paz: seu herói, o ateniense Trigeu, resolve libertar a figura alegórica que dá título à obra, mantida reclusa numa caverna, e o faz com a ajuda do coro.

Assiste-se, então, ao desespero dos aproveitadores da guerra, retratados nos “siderúrgicos”, ou fabricantes de armas. Por obra de Trigeu, outros artífices, os de pacíficos instrumentos agrícolas, triunfam. A Assembléia das Mulheres é uma sátira a ideias coletivistas de uma espécie de comunismo primitivo. Eurípides é o objeto do humor impiedoso de As Rãs e de As Festas de Ceres e Proserpina.

Comédia Nova - Menandro

Menandro

Menandro

Vencida por Esparta e governada pelos Trinta Tiranos, Atenas não mais desfrutou da antiga liberdade política e da prosperidade que dela fizeram a rainha das comunidades gregas. O teatro sofreu o impacto da modificação e da crise.

Empobrecido o tesouro público, já não era possível arcar com as despesas da organização dos coros, fator que afetou não somente o gênero cômico como também contribuiu para a decadência da tragédia. Os concursos públicos perderam a regularidade.

A comédia, na sua fase final, a chamada nova, pôde sobreviver, modificando-se. A diminuição do papel do coro, que não tem maior relação com a peça. Não mais a idéia do espaço cênico múltiplo, à maneira das peças aristofanescas, mas do espaço uniforme, sugerindo ordinariamente, uma rua ou uma praça, com duas casas que se defrontam e onde residem os personagens principais. Isto era ideal para atender as exigências da comédia de costumes, pois proporcionavam confronto de duas “intimidades”.

A escolha dos temas e o modo de os tratar – o amor e a pintura de caracteres ocupam o primeiro lugar. Críticas e investidas políticas, que eram tão freqüentes na Comédia Antiga desaparecem. É de notar que este padrão universalizou-se para a comédia, adotado que foi em Roma e revivido no Renascimento.

Máscaras da Comédia Nova

Máscaras da Comédia Nova

Comédia Nova

O mais importante de todos os autores da comédia nova, Menandro (Ménandros), nasceu em Atenas, em 342 a. C. e faleceu em 292 a.C. Sabe-se ter escrito mais de uma centena de peças, oito das quais vitoriosas nos concursos de comédias.

Seu prestígio no mundo antigo foi tamanho que o gramático Aristófanes de Bizancio escreveu a seu respeito no século II: “Ó vida, ó Menandro, qual de vós imitou o outro?”

Durante muito tempo dele só se conheceram fragmentos recuperados muito tardiamente, a partir do século passado e ainda no presente. Felizmente, em data muito próxima (1957), foi descoberta uma comédia integral, Dyskolos (O Rabugento, enc. 317 a. C.), publicada em 1958. Largo trecho de Epitrépontes (Os Árbitros) já era conhecido, em medida suficiente para situá-lo como a criação suprema de Menandro.

Este, assim como os de Samía, O Herói e Pericirômene, foram encontrados no Egito em 1905, proporcionando o primeiro convívio mais amplo com a literatura de Menandro, aumentado em 1963, quando se deparou quase a metade de O Homem de Sícyon, outra obra sua. Antes de 1905 apenas os fragmentos menores tinham sido recuperados.

Plauto e Terêncio, os melhores comediógrafos latinos, não somente tomaram a Menandro entrechos inteiros, como também cenas integrais, apenas vertidas para o latim com ligeiras alterações.

Menandro, como se notou, foi praticamente o criador da comédia de tipos. Sua temática envolve aventuras galantes, conflitos de interesses, ocorrências imprevistas.

Seus personagens podem ser definidos pelo padrão de virtude ou vício que os caracterizava: velhos avarentos, mães complacentes, cortesãs ambiciosas, soldados fanfarrões, escravos alcoviteiros, aqueles mesmos tipos, em suma, que se estratificaram na comédia posterior, de Plauto a Moliére.

“O TEATRO É O ESTADO, O LUGAR, O PONTO, ONDE SE APRENDE A ANATOMIA HUMANA. É ATRAVÉS DELA SE CURA E SE REGE A VIDA”. (Artaud)

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