Yeda Prates Bernis - escritora






enquanto-e-noite

Enquanto é Noite
Yeda Prates Bernis
Imprensa Oficial, BH - 1974
14 x 20,5 cm - 116 páginas

Prefácio
ENQUANTO É NOITE testemunha, claramente, uma personalidade de exceção pela delicadeza moral e finura de sentimentos. Em Yeda Prates Bernis reconheço índole artística marcante, forrada de qualidades líricas. Diante da beleza da vida e do panorama variável da existência, ela se faz presente. Com olhos de ver a natureza e dom de auscultar seres e cousas, humaniza temam ente a paisagem (Macchu Picchu, Cuzco, Diamantina). Com sabedoria e graça, distingue nuanças e ritmos para revelar notas muito íntimas de vivência, experiência e meditação (Passada, Pausa, Serenidade). Não se debruça ao espelho para refletir apenas sua imagem mas, ainda, as fluidas imagens de seus semelhantes, guardadas em si mesma com solicitude (Companheira, Solidariedade, Cumplicidade, Sombra).

Dessa forma, sua arte é representativa de um grupo social discreto, sólido e edificante, dentro do conceito cristão, todavia tocado pelas nostalgias e angústia do século. Sua concepção de poesia é vital, não somente estética. A arte pela arte não a tentaria. Mas sim a arte pelo todo, incluindo particular-mente as causas e efeitos da emotividade e as auras intuitivas. Ela crê e confia na inspiração. Ainda bem. Em recente estudo sobre o fenômeno, afirma Vladimir Nobokov: "Os conformistas desconfiam de que falar de inspiração é tão insípido e fora de moda quanto defender a Torre de Marfim. Entretanto, a inspiração existe, do mesmo modo que as torres e as plumas." ("Diálogo" - II - V. VI - 73).

A questão, pois, é captá-la, apreendê-la, dar-lhe disposição adequada no momento exato. Isso é possível sempre que houver vida interior em profundidade, como acontece com Yeda.

Na dupla vocação de Marta e Maria, ela sabe exercer com amor, desvelo e imaginação, os ofícios do quotidiano, assim como sabe irradiar, poeticamente, as impregnações de seu admirável temperamento.

Belo Horizonte, janeiro - 1974

Henriqueta Lisboa


Poemas:

ESPERA

Fiando fios de luar,
tecendo manto de estrelas,
Esperarei.

Na noite opaca,
uma candeia
de óleo, acesa.
A madrugada,
- uma promessa -
por entre brumas,
cantos de pässaros,
raios de sol.

Enquanto é noite,
olhos no além,
fiando luar,
tecendo mantos,
esperarei.


DESESPERANÇA

Último acorde
pelo ar
perdido.
um raio
último
de luz
partido.
A gota
última
de fel
sorvida.
O último respiro
adormecido.
A última palavra
sem querer
contida.
A derradeira flor
de sonho
ressequida.

(E uma lágrima
última
na face
florescida.)


EMBLEMA

No âmago da existência
a chaga viceja
rubra e silente.
Sangrar, nem sempre.
Apenas dilacera
a carne e a alma
em seu mundo
existir.

Verdade inalienável
que a vida escreve
com letras de sangue,
emblema rubro
- quase amorável -
- de quem
viveu.


SERENIDADE

À Henriqueta Lisboa

Borrasca
- esperança de mar calmo,
vendaval
- promessa de leve brisa.

Remanso do espírito
outrora conturbado
por paixões e inquietudes.
Agora,
e mais que agora
- sempre -
a faina incessante
por vencer o adverso
já por isto vencido,
e apenas torná-lo amigo
em amorável convívio.

Serenidade
- olhar para muito além
do além.


DIAMANTINA

Estradas brancas
me levam
por entre
pétreas montanhas
a uma serenata
no céu.


MOMENTO

O verde, em volta, preside
com matizes de esperança.

Um caracol, sobre a relva,
arrasta sua preguiça.

Pássaros imitam Vivaldi
em pureza e harmonia.

Frágeis borboletas sorvem
o colorido das flores.

E, na rede da varanda,
o coração é só paz.


 

Contato:

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