Tadeusz Kantor, parte 1
Teatro Contemporâneo

Tadeusz Kantor, parte 1

Teatro  Contemporâneo | Biografia Tadeusz Kantor

Texto: Márcia de Barros

 

Biografia

Tadeusz Kantor (Wielopole, 1915 – 1990), artista polonês, pintor, cenógrafo, encenador e criador de happenings e performances.

Formou-se na Academia de Belas Artes de Cracóvia, entre 1934 e 1939, onde estudou pintura e cenografia com um dos maiores cenógrafos do teatro polonês do séc. XX, Karol Frycz, que foi aluno e admirador de Gordon Craig.

Nesse período, Kantor desenvolveu a ideia de um necessário radicalismo artístico e da recusa de qualquer compromisso. Descobriu exemplos deste modo de entender a arte entre os russos e alemães dos anos 1920: Tairov, Meyerhold, Piscator e também a escola Bauhaus, com Moholy-Nagy e principalmente Oscar Schlemmer.

A sua formação inicial de pintor soma-se à criação literária e teatral, sob influência do simbolismo de Maeterlinck, do fantástico de E. Hoffmann, do universo de Kafka e, no âmbito polonês, de Witkiewicz, Schulz e Wyspianski.

Derivam desses contatos elementos chave como: a recusa do psicologismo, o lado infernal, o catastrofismo, a extrapolação das concessões tradicionais de tempo e espaço e das ligações convencionais entre causa e efeito, e o tomar a “destruição” e a “negação” como métodos artísticos.

Em 1942, criou o Teatro Clandestino, colocando em cena “A morte de Orfeo” de Jean Cocteau e Balladyna de J. Slowacki. E o mais surpreendente de todos, “O retorno de Ulisses” de S. Wyspianski, espetáculo que trazia já todos os elementos que delineariam sua atividade artística mais revolucionária, a qual, 20 anos mais tarde, seria determinante para as diferentes tendências da arte e do teatro contemporâneos incluindo happening e performance.

Vale a pena sublinhar que o espetáculo “O Retorno” de Ulisses já foi considerado o primeiro espetáculo realizado intencionalmente fora do teatro, chamado no Brasil de ‘espaço não-convencional’.

Em 1947, antes do alinhamento da Polônia com o bloco soviético, Kantor viaja a Paris, onde entra em contato com cubistas e surrealistas, e em particular com o pintor Roberto Matta, sofrendo a influência da sua pintura: a desumanização da figura humana. No encontro entre a forma humana e o objeto, Kantor define o território ambíguo que será fundamental nas suas obras a partir dos anos 1960.

Em 1955, retorna a Paris, onde conhece a obra de Pollock, o dadaísmo e o neo-dadaísmo.

Funda em Cracóvia (1955), o Teatro Cricot 2, e manteve-se em sua direção até 1990. Kantor ficou mundialmente conhecido nos anos 1970/80 com o espetáculo A classe morta.

Após a criação da companhia teatral Cricot 2, surgem o Teatro Zero, em 1963, Teatro Happening, em 1967 e finalmente, em 1975, o Teatro da Morte. Fazem parte desta última fase os espetáculos “A classe morta”, ‘Wielopole-Wielopole’, ‘Que morram os artistas’, ‘Aqui não volto mais’ e ‘Hoje é meu aniversário’.

Introdução

Tadeusz Kantor

Tadeusz Kantor nasceu em Cracóvia, Polônia, em 1915. Cursou a escola de Belas Artes, onde teve como mestre Karol Fryes, um admirador e amigo de Gordon Craig. Também recebeu influência de toda a “avant garde” dos anos vinte, a escola de Bauhaus, o construtivismo russo, as idéias dadaístas e futuristas.

Ele diz: “Durante meus estudos no Liceu e na Escola de Belas Artes estava influenciado pelo simbolismo. Lia apaixonadamente Witkiewicz e Wyspians. Conhecia os dramas de Maeterlinck. As formas radicais como o construtivismo, a abstração geométrica, a Bauhaus, me absorviam”…”ademais , a atmosfera artística dos anos 30 era, simplesmente, de familiaridade com a morte”.

Kantor constrói um “novo paradigma” na cena teatral: “a unidade é a idéia, o sentimento. Funciona como mistério para o homem. É a noção abstrata, por excelência filosófica. Em poucas palavras, é Deus. É dizer, criando esta unidade: o teatro deve ser uma eterna recriação do mundo, do universo, do cosmo.

Então, tem que chegar um momento na participação, na representação, em que todos, espectadores e atores, brilhem como deuses.” Um teatro que se constrói na ação e não pelo aparato de reprodução literária. Um texto dramático, não fechado, não conclusivo, incongelável: “um mapa do tesouro e, ao mesmo tempo, uma pista falsa.”

Kantor constrói no limite entre a realidade e a ficção: “a função do teatro é estabelecer essas duas fronteiras bem nítidas entre o que é vida e o que é ilusão”. Ele constrói uma nova totalidade, difícil de ser prevista antes de ser criada e antes que possa, após várias tentativas, aparecer.

Busca retornar ao teatro não institucionalizado, ao “CIRCO AMBULANTE”, um estranho lugar sem lugar, de acontecimentos estranhos e inesperados; uma comunidade onde se cria e recria, e dispersa e torna a juntar; uma comunidade de pessoas, com suas relações mútuas, transformações, experiências, com seus utensílios portáteis (que carregam de um espetáculo a outro), suas tramas, suas ideias, onde, Kantor sempre presente como inspirador e criador de espetáculos, constrói essa nova totalidade, que surge do imprevisto objetivo, da cena, da experimentação, do “é em cena que tudo se fará”, como diz Antonin Artaud.

A Cena. O Espaço. O Objeto. A Repetição

A Galinha Aquática (1967)

A Galinha Aquática (1967)

A CENA. O ESPAÇO.

Poeta da cena, o espaço sempre foi fundamental para ele: “os vastos espaços me fascinam, têm para mim um valor autônomo, elástico, animado por movimentos de extensão e contração. São vivos”.

kantor

O OBJETO

Para Kantor um espetáculo é uma obra de alquimia onde “todos os elementos, nobres ou pobres, participam da destilação para que o processo se realize”. Texto, ator, objeto, espaço e espectador: um conjunto, onde todos são igualmente importantes. O objeto ocupa posição importante em seu trabalho onde trata sempre da relação ator-objeto.

E o que se usa é um objeto qualquer, apenas recuperado para significados artísticos e emocionais. Quanto menos importante for ele, maiores possibilidades revela. O objeto é, para Kantor, uma espécie de prótese do ator.

Cada personagem tem o seu próprio objeto que, ligado a seu corpo, forma com ele um só ser. Na cena esses objetos vão mudando de significado. Ângulos e linhas que se modificam no contexto da cena. A manipulação do objeto e suas relações com o personagem conferem ao objeto aspectos mágicos e inesperados.

Há uma cena na peça “Wielopole-Wielopole” de que Brunella Eruli em seu livro “Lê Voies de la Création Theatrale”, nos dá detalhes sobre uma máquina fotográfica de função ambígua. Nessa cena a máquina fotográfica, daquelas antigas com sanfona, toma um significado duplo.

Ao tirar a foto para prosperidade, por um segundo, a máquina prende as pessoas na pose, estáticos e imóveis: eterniza assim um momento vivo, prendendo-o na imobilidade da imagem, mas, ao mesmo tempo, ao bater a foto, a máquina, na cena, se transforma em metralhadora.

A fotografia ao mesmo tempo em que eterniza, mata o momento. É a sua metáfora. No estático e no inerte, a vida está como que morta, ausente. Mas é justamente nessa aparência de morte, de não vida, que a vida se torna mais presente. Como se a morte fosse vida.

A Galinha Aquática (1967)

A Galinha Aquática (1967)

A REPETIÇÃO

Para Kantor, a realidade depende da ilusão para se manifestar. Para ele, realidade é sempre alguma coisa que já existiu. Daí a importância da REPETIÇÃO, outro tema importante em seu trabalho.

Repetir um gesto, uma, duas, três, várias vezes, é tornar presente alguma coisa anterior a nós mesmos, alguma coisa que já existe e perdura em nós, como um eco. Existe agora, e ao mesmo tempo não existe, como a foto ou uma imagem. Na repetição, revela-se o que nessa ideia, existe de permanente.

Objetos, formas, máquinas, bonecos, manequins são peças intrínsecas no teatro de Kantor. Arte, vida, repetição são para ele ecos, reflexos de realidade anterior. Na repetição, como na vida ou na arte, o supérfluo se esvai, o essencial fica.

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