ANTONIN ARTAUD - TEATRO: UM ATO TOTAL |
1. INTRODUÇÃO
Circunavegar esse mar mediterrâneo do universo artaudiano veio para mim como um duplo desafio: por um lado, elucidar a concretude da proposta do Teatro e seu Duplo, de Antonin Artaud, em relação à linguagem total do teatro; por outro lado, resgatar a obra de Artaud como o trajeto de um visionário que não teve medo de se adentrar nos recônditos mais profundos da vida (da sua e da realidade de sua época) e, de maneira particular, do teatro, sendo ele mesmo homem teatro, para ressurgir em OBRA VIVA, legando-nos um marco para a Estética Teatral Contemporânea. Já dizia Barrault: "De longe, a coisa mais importante que se escreveu acerca do teatro no século XX". É necessário considerar que não pretendo transformar a obra de Artaud num receituário para a arte cênica. O legado que ele nos deixa não é uma geografia que pode ser colonizada, mas pontos de partida, indicações de caminhos, em que idéias suscitam idéias, em que a obra transcende a si mesma. |
Esse homem-teatro é, em si, uma obra de arte e, portanto, estará sempre fora de alcance, nunca poderá ser esgotado. Como diz o próprio Artaud: "A verdadeira beleza nunca nos atinge diretamente. E é assim que o pôr- do- sol é belo por tudo aquilo que nos faz perder" (...) idéias claras são idéias mortas e acabadas." Assim, pretendo evidenciar algumas sinalizações que Artaud nos apresenta, a partir de suas críticas à cultura, ao teatro de sua época e de suas epifanias para o teatro, enquanto ato total: "uma projeção escaldante de tudo aquilo que pode ser retirado de um gesto, uma palavra, um som, uma música e da combinação entre eles." Este artigo é um resumo da minha dissertação de mestrado, na USP, São Paulo, cujo tema foi "Em busca de uma Escritura Cênica a partir de Artaud". Para uma melhor compreensão da obra de Artaud e da sua proposta de teatro como ato total, o texto é dividido em três partes: Cultura - Vontade de Potência; A Necessidade Implacável da Criação; A Nova Linguagem do Teatro. O meu encontro com Artaud veio confirmar a trajetória que eu já vinha percorrendo, na buscar de recuperar o verdadeiro sentido do teatro enquanto um ritual que exige de seus participantes rigor, disciplina, determinação, coragem, generosidade. Um ritual que é ação e que acontece no tempo e no espaço da cena e que só pode viver em cena, onde passado, presente e futuro se unem naquele instante preciso do ato total. Um teatro que saiba nomear e dirigir as sombras, trazendo à luz do dia verdades que, de outra forma, permaneceriam ocultas. Um teatro que fale a sua linguagem concreta, linguagem física, linguagem materializada no corpo e na voz dos atores e em tudo o que acontece em cena, evocando um universo, onde tudo assume um sentido, um mistério, uma alma. É esse o caminho que percorro na minha pesquisa e investigação teatral. Caminho que percorro por uma necessidade vital e que recebi de herança ancestral, legada por tantos outros sonhadores e fundadores de mundos para além de mundos conhecidos. E que esse caminho possa, por sua vez, ser herança para tantos outros que estão e virão. "E que com o hieróglifo de uma respiração, eu possa encontrar uma idéia do teatro sagrado".( Artaud ) |
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